domingo, 2 de setembro de 2007

A Corneta do Diabo

Noivos e com todo um futuro pela frente, Maria Eduarda confessa a Carlos a sua juventude desordenada e de ambientes duvidosos que, juntamente com a mãe, explicam a sua vida atribulada e ao sabor de amizades de conveniência.
Mais uma vez Carlos sente o espinho do Avô que jamais aceitaria o casamento do neto com uma mulher que na sua vida cometera tamanhos erros. Surge então a voz da razão, Ega, que aponta como a melhor solução a espera paciente da morte inevitável do velho Maia, assim este acabaria “a sua velhice calma, sem desilusões e sem desgostos”.
Num expoente de felicidade surge a necessidade - psicológica, está claro – de trabalhar, fazer algo pelo país em vez de se limitarem a criticar. Carlos relembra então “a velha ideia do cenáculo, representado por uma revista que dirigisse a literatura, educasse o gosto, elevasse a política, fizesse a civilização, remoçasse o carunchoso Portugal”.
No domingo Cruges vai jantar à Toca, mas um tempo que deve ser bem passado revelou-se um completo falhanço devido ao temperamento tímido e desinserido dos hábitos da sociedade do maestro que ficara totalmente intimidado pelo “porte de grande dame” de Maria.
Numa manhã, Carlos encontra no correio um artigo da Corneta do Diabo – jornal de pilhérias e picuinhas pertencente a Palma – cuja impressão em boa hora havia sido suspensa por Ega e no qual constam, numa linguagem sem nível, terríveis calúnias sobre o passado de Maria e sobre a sua relação com Carlos.
Este artigo surte reacções contraditórias no Maia: por um lado só pensa em matar o autor de tamanha ofensa, mas por outro pela primeira vez se questiona se “a honra doméstica, a honra social, a pureza dos homens de quem descendia, a dignidade dos homens que dele descendessem, lhe permitiam verdadeiramente casar com ela…”. Esta dúvida no entanto depressa encontra um fim e Carlos dedica-se à vingança do difamador que só pode ser “alguém frequentador da Rua de S. Francisco; alguém conhecedor da Toca; alguém que tinha, por ciúme ou vingança, um desejo ferrenho de magoar Carlos; alguém que sabia a história de Maria; e enfim que era um cobarde…”, resumindo Dâmaso!
A fim de arranjarem provas concretas - a carta do “amigo que encomendara a piada”, a lista dos que deviam receber o jornal e até o rascunho a lápis do artigo -, deslocam-se ao gabinete de Palma Cavalão que subornado tudo lhes dá.
Neste capítulo Eça critíca a degradação ética dos jornais que, aliado a um ambiente degradado, resulta em mais um vergonha para o país. E tem ainda tempo para ridicularizar o governo que, sendo composto sempre por homens de “talentos pujantes”, deveria ser agora constituído por imbecis.
Ao entrarmos em casa de Dâmaso Salcede constatamos que a sua ornamentação espampanante e semelhanças com o Ramalhete contrasta com a baixeza moral da personagem e demonstrada pelo embaraço aflito que revela perante a opção que Ega e Cruges lhe colocam: “ou se retracta publicamente dessa injúria, ou dá uma reparação pelas armas”. Cobarde como é só lhe resta desdizer-se, para isso o próprio Ega, desejoso de, também ele, se vingar por estar certo que Dâmaso era amante de Raquel, redigiu a carta que este passa depois a limpo e assina. Nesta carta Dâmaso admite que o artigo, escrito num dos estados de embriaguez que, sendo um problema hereditário, eram frequentes, continha apenas falsidades e incoerências. Esta carta não deveria ser publicada, mas o ciúme de Ega cegava-o, e acaba por a publicar noutro jornal A Tarde, como sendo uma questão de honra. Este episódio culmina na partida de Dâmaso para Itália.
Afonso dá três conselhos ao país: “aos políticos: “menos liberalismo e mais carácter”; aos homens de letras: “menos eloquência e mais ideia”; aos cidadãos em geral: “menos progresso e mais moral””.
O capítulo finda com o olhar crítico de Ega sobre a literatura e a política: “antigamente a literatura era a imaginação, a fantasia, o ideal… Hoje é a realidade, a experiência, o facto positivo, o documento”, “no tempo da Regeneração e dos Históricos, a política era o progresso, a viação, a liberdade, o palavrório… Nós mudámos tudo isso. Hoje é o facto positivo – o dinheiro, o dinheiro! O bago! A massa! A rica massinha da nossa alma, menino! O divino dinheiro!”.

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